A vida bloqueada
instiga o teimoso viajante
a abrir nova estrada.

Helena Kolody

terça-feira, 31 de julho de 2012

ARAUCÁRIA

Araucária

Araucária,
Nasci forte e altiva,
Solitária.
Ascendo em linha reta
- Uma coluna verde-escura
No verde cambiante da campina.

Estendo braços hirtos e serenos.

Não há na minha fronde
Nem veludos quentes de folhas,
Nem risos vermelhos de flores,
Nem vinhos estonteantes de perfumes.
Só há o odor agreste da resina
E o sabor primitivo dos frutos.

Espalmo a taça verde no infinito.
Embalo o sono dos ninhos
Ocultos em meus espinhos,
Na silente nudez do meu isolamento.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

ANOITECER


 Anoitecer

Amiudam-se as partidas...
Também morremos um pouco
no amargor das despedidas.

Cais deserto, anoitecemos
enluarados de ausências.

VIGÍLIA


 Vigília

A noite é profunda,
Silente e de trevas.

Ao lado de teu corpo, imóvel e sereno,
Estou a contemplar-te, Pai.

Por estranhos caminhos,
Cheios de neblina,
Anda minh’alma soluçante,
A clamar por ti.

Teus olhos fitam muito longe
Um olhar imensamente triste.

A chama dos círios dança sem cessar
Em tuas pupilas mortas,
Tentando desviar tua mirada
De um ponto fixo na eternidade.

Círio recôndito,
Arde meu coração e se consome.

Há longos espinhos aguçados
Esgarçando meus nervos sensíveis.

Beijo tuas mãos pálidas e tristes,
Humildes mãos cansadas,
Agora consteladas
Por líquidos brilhantes.

Por estranhos caminhos,
Cheios de neblina,
Anda minh’alma soluçante,
A clamar por ti.

CHAMA


 Chama

Chama do Absoluto,
arde o verbo em nossa lâmpada humilde.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

PRECE


 Prece

Concede-me, Senhor, a graça de ser boa,
De ser o coração singelo que perdoa,
A solícita mão que espalha, sem medidas,
Estrelas pela noite escura de outras vidas
E tira d’alma alheia o espinho que magoa.

INFÂNCIA


Infância

Aquelas tardes de Três Barras,
Plenas de sol e de cigarras!

Quando eu ficava horas perdidas
Olhando a faina das formigas
Que iam e vinham pelos carreiros,
No áspero tronco dos pessegueiros.

A chuva-de-ouro
Era um tesouro,
Quando floria.
De áureas abelhas
Toda zumbia.
Alfombra flava
O chão cobria...

O cão travesso, de nome eslavo,
Era um amigo, quase um escravo.

Merenda agreste:
Leite crioulo,
Pão feito em casa,
Com mel dourado,
Cheirando a favo.

Ao lusco-fusco, quanta alegria!
A meninada toda acorria
Para cantar, no imenso terreiro:
“Mais bom dia, Vossa Senhoria”...
“Bom barqueiro! Bom barqueiro...”
Soava a canção pelo povoado inteiro
E a própria lua cirandava e ria.

Se a tarde de domingo era tranquila,
Saía-se a flanar, em pleno sol,
No campo, recendente a camomila.
Alegria de correr até cair,
Rolar na relva como potro novo
E quase sufocar, de tanto rir!

No riacho claro, às segundas-feiras,
Batiam roupas as lavadeiras.
Também a gente lavava trapos
Nas pedras lisas, nas corredeiras;
Catava limo, topava sapos
(Ai, ai, que susto! Virgem Maria!)

Do tempo, só se sabia
Que no ano sempre existia
O bom tempo das laranjas
E o doce tempo dos figos...

Longínqua infância... Três Barras
Plena de sol e cigarras!

sexta-feira, 13 de julho de 2012

JOVEM

Jovem

Suporta o peso do mundo.
E resiste.

Protesta na praça.
Contesta.
Explode em aplausos.

Escreve recados
nos muros do tempo.
E assina.

Compete
no jogo incerto da vida.

Existe.

***


O bom e velho Rock’n’ Roll
Por Lilian Andrade


Surgindo nos Estados Unidos no início da decada de 40, sendo inicialmente caracterizado, sobretudo, por raça, nacionalidade e religião, o rock’n’ Roll brota como ritmo musical que ultrapassou as fronteiras geográficas.
Em meados dos anos 50, o Rock’n’Roll consolida-se com Elvis Presley, ocorrendo então a popularização do rock e se transformando num ícone para a indústria musical norte-americana, repercutindo na difusão e expansão do gênero musical   para o resto do mundo.
A linguagem do Rock’n’Roll sistematizou ideais, repercutindo num mundo social uniforme, tornando-se  a forma expressiva da nascente contracultura, cujas particularidades eram respaldadas por protestos e contestações políticas e sociais, além da manifestação de repulsa contra as guerras insanas da época, em especial, a Guerra do Vietnã.
Uma das repercussões sociais do Rock’n’Roll encontra-se na luta contra a segregação racial nos Estados Unidos, da qual o rock com mesclas musicais de negros e brancos causou impactos sociais e culturais na Guerra Civil, cujo Manifesto pelos Direitos Civis é aprovado pela Suprema Corte, levando o movimento a abrir caminho para a aprovação da Lei dos Direitos Civis, historicamente marcado por Martin Luther King, na Marcha sobre Washington, ao pronuciar o célebre discurso: “ Sonho com dia em que meus quatro filhos pequenos viverão numa nação em que não serão julgados pela cor da pele, mas por seus méritos”.
O Rock’n’Roll presente na contracultura, onde uma das formas de contestação da revolução cultural é fortemente marcada pelo movimento hippie cujo estereótipo é evidenciado pela rejeição à sociedade de consumo industrial, desdenho às normas de comportamento e entrega infeliz ao sexo e às drogas, fazendo-se valer do rock como forma de linguagem e protesto à sociedade tecnocrática, individualista, consumista e competitiva. Também como forma de contestação, o movimento hippie defendia abertamente uma vida alternativa, desprezando tudo que pudesse ser consubstanciado como essência da agressão ao Vietnã.
O movimento hippie acreditava nas possibilidades de mudança dos parâmetros de costumes, vistos como alicerces da mentalidade social que desprezavam. O ápice da contracultura ocorreu no Festival de Woodstock numa manifestação pela paz e numa celebração pelo rock.
E por diversas partes do mundo, o rock apresenta-se como um ritmo musical de protestos, e, ainda, de composições fecundadas pelo lirismo de canções de amor, entoando uma linguagem peculiar que somente o bom e velho Rock’n’Roll possui.

13 de julho – Dia Internacional do Rock
 

quinta-feira, 12 de julho de 2012

MERGULHO


 Mergulho

Almejo mergulhar
na solidão e no silêncio,
para encontrar-me
e despojar-me de mim,
até que a Eterna Presença
seja a minha plenitude.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

SONHAR

Sonhar

Sonhar é transportar-se em asas de ouro e aço
Aos páramos azuis da luz e da harmonia;
É ambicionar o céu; é dominar o espaço
Num vôo poderoso e audaz da fantasia.
Fugir ao mundo vil, tão vil que, sem cansaço,
Engana, e menospreza, e zomba, e calunia;
Encastelar-se, enfim, no deslumbrante Paço
De um sonho puro e bom, de paz e de alegria.
É ver no lago um mar, nas nuvens um castelo,
Na luz de um pirilampo um sol pequeno e belo;
É alçar constantemente o olhar ao céu profundo.
Sonhar é ter um grande ideal na inglória lida:
Tão grande que não cabe inteiro nesta vida,
Tão puro que não vive em plagas deste mundo.

domingo, 1 de julho de 2012

ADVERTÊNCIA



Advertência

É meio-dia em minha vida.
Um mensageiro inesperado
Vem prevenir que apresse a lida,
Como se fosse anoitecer.

Vento da noite, ainda é cedo!
... e nem lavrei a terra agreste.

IDENTIFICAÇÃO



Identificação

Eu me diluí na alma imprecisa das coisas.
Rolei com a Terra pela órbita do infinito,
Jorrei das nuvens com a torrente das chuvas
E percorri o espaço no sopro do vento;
Marulhei na corrente inquietadora dos rios,
Penetrei a mudez milenária das montanhas;
Desci ao vácuo silencioso dos abismos;
Circulei na seiva das plantas,
Ardi no olhar das feras,
Palpitei nas asas das pombas;
Fui sublime n’alma do homem bom
E desprezível no coração do mesquinho;
Inebriei-me da alegria do venturoso;
E deslizei dolorosamente na lágrima do infeliz.

Nada encontrei mais doloroso,
Mais eloquente,
Mais glorioso
Do que a tragédia cotidiana
Escrita em cada vida humana.

POETA



Poeta

O poeta nasce no poema,
inventa-se em palavras.

LIÇÃO


 Lição

A luz da lamparina dançava
frente ao ícone da Santíssima Trindade.
Paciente, a avó ensinava
a prostrar-se em reverência,
persignar-se com três dedos
e rezar em língua eslava.
De mãos postas, a menina
fielmente repetia
palavras que ela ignorava,
mas Deus entendia.